Eu andei longe do blog e de várias outras coisas que me dão prazer.
Então, aproveitando que hoje eu falei com tanta gente legal q eu tenho saudade e o Sam I Am, querido, me perguntou por que eu tinha desistido do blog, e sexta-feira agora, Saturno volta pra sua casa e quem sabe eu volto a ter paz, vamos lá:
Eu ando fugindo de umas coisinhas que andam me rondando, já faz algum tempo. E aí pra escrever a gente pensa na vida e eu não andava podendo pensar na vida, então parei de escrever.
Eu ando brigando com um troço chamado depressão desde o ano que a Larissa foi embora da república pra França, eu não me ligo em números então não sei bem que ano foi. Acho que isso foi uma das coisas mais horríveis que me aconteceu e foi um pouco depois da morte da minha prima Alessandra, que foi definitivamente a pior coisa que já aconteceu a mim e a família Lacerda como um todo. É engraçado eu já perdi meu avô (que deve disputar com meu pai, o lugar de amor da minha vida), já perdi namorados, mas acho que foi me separar de duas das grandes figuras femininas importantes da vida o que abriu um buraco no meu coração, naquele ano, e não fechou mais. As coisas meio chatas e meio complicadas que me aconteceram de lá pra cá arranjaram um lugar pra morar. E acho que essa é a definição de depressão, a tristeza arranja esconderijo em vc. E, às vezes, nem vc percebe.
Isso me faz pensar, a presença feminina é de outra ordem. Meu pai, meu avô são homens, com homem é galanteio, são momentos específicos que fazemos parte da vida deles e eles da nossa. Mulher é diferente. Presença feminina, tipo mãe, é coisa de todo dia, de ouvir, socorrer e brigar e saber como vc está de olhar na sua cara. Funciona assim com minhas amigas, primas, mãe e irmã. Quando vc perde um homem, vc sente falta em determinados momentos, quando uma presença feminina se vai a gente nota todo dia.
Enfim, eu odeio assumir a possibilidade de ter depressão porque eu sempre achei uma puta viadagem , coisa de quem não tem nada pra fazer. Obviamente, eu andei me entupindo de coisa pra fazer tipo dois empregos e o mestrado e quando o mestrado acabou eu tirei férias e adivinha só? Eu descobri mesmo que tristeza pode ser doença. Eu tinha o costume de mandar minhas amigas que vinham de lenga-lenga irem cortar cana. Acho que cortando cana, na rua, na chuva ou na fazenda a gente vai com os machucados e as cicatrizes.
Bom, eu ando com uma preguiça monstruosa e eu não sou assim. Agora o mais interessante é que eu ando com uma preguiça absurda de gente. Meu Deus. Eu conheço pouca gente com quem eu gosto de falar e elas estão em outro canto. Vivendo outras coisas. Na maioria das vezes, conversar me é doloroso. Cansativo. Eu não gosto mesmo de gente. Meus amigos sabem que eu prefiro o Manoel ao meu vizinho e a muita gente. O negócio é que isso não anda ajudando e trabalhar em casa muito menos.
Meu irmão do coração, Ruyzitos, que está sempre ao redor de mim daquele jeito silencioso e ao mesmo tempo barulhento porque ele é grandão e tem a respiração pesada e é cantarolengo também. Enfim, deixa essa frase aí, preciso de outra. Ele uma vez me falou pra escrever as imagens horrorosas que, ás vezes, me vinham à cabeça. E foi assim que o Paulo Cabeça Torta surgiu - meu personagem que eu tento escrever a tanto tempo. Eu lembro que uma das metas bobas de 2010 era terminar essa estória. Então, eu vou sempre escrever um pouquinho, todo dia. Porque eu não consigo acreditar em Terapia e olha que minha mãe é terapeuta especialista em Jung. Tem gente que acredita em Deus, tem gente que acredita em Freud e tem gente que acredita em Jung. Eu juro que vi com esses meus olhos que há gente que acredita em Lacan e na Eni Orlandi. Eu, por minha vez, não acredito em Terapia, sou mais Deus e a Eni. Não necessariamente nessa ordem. Ha! Bazinga!
A digressão “Ruyzitos, Cabeça Torta e Terapia” tinha um propósito. Eu descobri que trabalhar muito não sara tristeza, ficar dias na cama também não. Então eu vou escrever. Toda vez que eu imaginava uma coisa feia acontecendo comigo enquanto morava em São Paulo (foi a época que o Ruy me falou aquilo) eu escrevia e o medo passava. Deve ser o mesmo princípio para tristeza. Eu acho que escrever as tristezas dá sentido pra elas. É tudo energia e tem uma função, me parece.
Então hoje eu vou contar uma coisa triste. Eu vou contar porque eu nunca me matei. É uma história, foi um dia que eu encontrei com o Agilulfo, o cavaleiro inexistente do Calvino:
Suicídio sempre foi uma ideia encantadora sob meu ponto de vista. Eu tenho uma coisa com conforto. Eu acredito, por exemplo, que se vc está desconfortável em um lugar e com uma roupa, vc tem o direito de sair ou tirar a roupa.
Eu desde que me lembro, às vezes, me sinto desconfortável na minha pele e na minha vida. Eu nunca fiz nenhuma bobagem dessa natureza porque eu cresci num lar espírita e o que eu aprendia em casa e que se aqui está desconfortável, pros suicidas lá do outro lado, está bem pior. Depois estudando mais a doutrina, aprendi que, na verdade, na hora da morte ng está sozinho. Sempre tem uma alma boa pra te socorrer se vc estiver a fim, o foda do suicídio é vc com sua consciência depois. Mas, eu pensava crise consciência por crise de consciência eu posso ter em qualquer canto.
A questão é morrer depois ter vivido e criado vínculos é muito complicado, muito difícil. Pode dar trabalho, gastar tempo, pode até doer (eu sou contra dor). Se vc morre com 29 arrasa todo mundo, é um saco, até meu vizinho que me odeia diria “puxa, uma moça tão nova”.
O bom mesmo era não existir.
Quando eu era criança, às vezes eu acordava com uma sensação estranha de não existir. Aí eu esperava um pouquinho, e se fosse dia de semana vinha minha mãe me chamar, se fosse final de semana, meu pai. Quem existe é sempre lembrado, e lembra. E eu lembro, logo existo.
Vou copiar o trecho do livro do Calvino que me convenceu a existir:
"Na hora do alvorecer Agilulfo precisava dedicar-se a algum exercício de precisão (...) É a hora em que as coisas perdem a consistência de sombra que as acompanhou durante a noite, e readquirem pouco a pouco as cores, mas nesse meio tempo atravessam uma espécie de limbo incerto, somente tocado e quase envolto em halo pela luz: a hora em que se tem menos certeza da existência do mundo"
E:
“Também a existir se aprende”.
O Agilulfo me ensinou que a gente toma a decisão de existir e é um exercício diário. E é opcional também, mas depois de tomada a decisão, já era, aliás, já é, já existe.
Minha mãe me conta que quando eu nasci o médico me colocou nos braços dela e ela me deu beijo na testa, eu aposto que eu decidi existir ali. Imagina, depois do medão que deve ter sido mudar de ambiente e plano, o quão confortável não tava aquele colo. Eu preciso só de um exercício de exatidão nas horas mais escuras de incerteza. ;)
3 comentários:
Hmmmm..
Que belo texto. Li tudo.
Bem vindo novamente, Maíra.
bj
Samuel.
Tu escreve bem pacas.. Gostei da história
gostei. gostei do seu texto, das referências...gostei. vou voltar.
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